
Meu telefone toca. Do outro lado da linha ouço uma voz estranha. Pergunto quem é.
– Sou Garrincha, responde.
– Garrincha!!! Meu Deus!
– Não precisa ter medo. Sei que você não me viu jogar, mas com certeza se lembra de mim. Pode me chamar de Mané. Era assim que me chamavam. Sempre gostei muito dessa pronúncia. O povo é sábio.
– Mas por que você me escolheu? Sou apenas um foca. Deveria ter ligado ao Pedro Bial, afinal ele entende de futebol e adora fazer crônicas sobre o tema.
– Aí é que está, meu nobre jornalista. Foi o primeiro nome que me viera à cabeça, mas quando o chamei, ele me disse que estava escrevendo o balé mágico que fazem as pernas de Neymar em campo. Certamente ele não conheceu as minhas, modéstia à parte, embora fossem tortas.
– Ah, que pena! Mas o homem é poeta, Mané.
– Indubitavelmente um poeta menor.
– E o Galvão? Por que não o Galvão?
– Depois do Bial, liguei a ele.
– E?
– Mandou dizer-me pela secretária, que estava em sua banheira de hidromassagem e não podia me atender. Aquele homem calado é outro poeta
– Provavelmente se preparando para transmitir os jogos da seleção…
– Tenho quase certeza que sim. Agora você chegou ao ponto que eu queria discutir.
– Discutir o quê, Mané?
– Ora, a Copa do Mundo!
– Vai haver Copa?
– Por que não haveria de haver, menino? Começo a ficar preocupado. Aliás, esse é o motivo pelo qual resolvi falar com você.
– Então vamos, Mané, diga o que o deixa aflito.
– O que me deixa aflito é o que a Globo começa a fazer.
– Por exemplo…
– Agora deu de transmitir ao vivo o treino da seleção. Assim como fizera na Alemanha. Domingo pela manhã tive o desprazer de ver isso.
– Eu também Mané.
– Você assiste à Globo? Porque que eu saiba você tem sido um crítico ferrenho das Organizações.
– Às vezes vejo um ou outro programa.
– Você viu que havia um repórter da emissora carioca transmitindo o treino? O rapaz estava empolgadíssimo.
– Sim, vi com os próprios olhos.
– Que redundância engraçada, nobre jornalista.
– O que você, Mané, achou da administração de Ricardo Teixeira e João Havelange?
– Acabo de receber aqui das mãos de Nelson Rodrigues o livro O Lado Sujo do Futebol. É um primor. Não que eu desconhecesse as facetas desses dois por você citados, mas agora lendo as páginas recheadas de bom jornalismo investigativo, sinto-me mais à vontade para dizer com todas as letras o que verdadeiramente penso de ambos.
– E o que pensa, Mané?
– Acho que eles e a Globo têm tudo a ver. São a corda e a caçamba. Lembro-me que no dia em que Ricardo Teixeira deixou a CBF, a Globo prestou no Jornal Nacional uma extensa homenagem a ele.
– Embora houvesse um momento em que a Globo quisesse destruí-lo, contudo não conseguiu. Você há de recordar-se.
– É verdade. Acompanhei aqui de longe.
– E esse outro senhor que assumiu no lugar dele?
– Acho que trocaram seis por meia dúzia. Esse Marim é do mesmo naipe que o Teixeira.
– Você está confiante na seleção de Felipão?
– Acho que o Brasil se encontra entre as melhores seleções que estão no mundial
– Então seremos campeões?
– Espere um pouco. Vamos devagar com andor.
– Alguém já disse que uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa.
– Quero um palpite seu para o primeiro jogo.
– É melhor perguntar ao Galvão. Ele sim poderá responder com entusiasmo. Adeus, meu rapaz.
– Adeus, Mané.