“Temos um Poder Legislativo que se cala diante do Executivo”

88cb5ddc-ae43-4f74-b5aa-7e2152569da4Raimundo Ferreira de Mendonça, 41 anos, casado, bacharelando em Ciências Contábeis, servidor público estadual e militante de esquerda é o nosso 59º entrevistado da série de entrevistas que levamos ao ar todos os sábado e que, excepcionalmente, estamos publicando neste domingo. Uma boa leitura!

BEZERROS HOJE – Sua militância política começa com o movimento estudantil em Bezerros em meados dos anos 90. O que motivou essa sua participação?

RAIMUNDO FERREIRA- Sempre fui motivado por minha família a estar presente no meio político. Nos ano 90, quando Geandre foi eleito presidente da UESB, eu também participei juntamente com outros companheiros como Roberval, Gildo Bezerra entre outros e assim realizamos vários eventos, mobilizando a juventude. Um desses maiores eventos foi o movimento do FORA COLLOR em 1992. Em 1994, fui convidado a participar do PC do B e desde então continuo militando ao lado de vários camaradas. É bom salientar que as circunstâncias nos motivam a participar e termos consciência de que o trabalhador tem que lutar por seus direitos todos os dias. É preciso saber que tudo estar em movimento e aquilo que se tem hoje pode ser perdido amanhã, o mesmo acontece com as conquistas sociais.

BEZERROS HOJE- Como você observa a luta pelas bandeiras de esquerda no país. Qual a importância desse debate ideológico no âmbito municipal e como explicar a diferença entre pensamentos esquerdistas e de direita para a população?

RAIMUNDO FERREIRA- Desde 2003, quando elegemos o Presidente Lula e a continuação de seu governo houve uma acomodação dos movimentos populares. Isso foi muito ruim para a esquerda, pois ao invés de aumentar seu campo de influência, estacionou e perdeu espaço. Por exemplo, é igual a um saco de farinha, ou seja, quando ela sai do forno quente pesa 52 Kg, porém quando ela esfria perde 2 Kg e fica com seu peso exato que deve ser 50 Kg. O resultado prático disso tudo é o que acontece hoje no país. Um governo ilegítimo no qual o Ministro da Saúde diz que “o povo inventa doença e que os homens adoecem porque trabalham mais que as mulheres…” e a repercussão é muito pequena. Em uma sociedade mobilizada politicamente, ele já teria pedido demissão. O debate ideológico no âmbito municipal é fundamental para a conscientização e mobilização das pessoas. São os Municípios que formam os Estados e o País. Com o avanço tecnológico, o mundo tornou-se pequeno como canta Gilberto Gil: “antes mundo era pequeno porque terra era grande. Hoje mundo ficou grande, do tamanho da antena parabólica…” Então, explicar para a população a diferença entre esquerda e direita não é fácil. Sobretudo, no momento em que a tecnologia criou nas pessoas uma falsa aproximação, elas se abrem para o mundo através das redes sociais, mas se fecham para aqueles que estão próximos. Portanto, ao meu ver, uma forma de mobilizar as pessoas é despertar nelas a consciência de que devem lutar pelo que acreditam. Direitos não se ganham de mãos beijadas. Direitos se conquistam com muita luta e esforço e com muita estratégia e tática. Podemos dizer que é o popular jogo de cintura, pois como escreveu Lênin (líder da Revolução Russa) no seu livro ESQUERDISMO DOENÇA INFANTIL DO COMUNISMO, com radicalismos, extremismos e tantos outros “ismos”, não se chega a lugar nenhum.

BEZERROS HOJE- O seu partido, o PCdoB, chegou a ser protagonista em Bezerros, elegendo vereador e vice-prefeito. O partido vive hoje um processo eleitoral buscando o que tentou na década de 90: eleger um representante para o legislativo. Comente…

RAIMUNDO FERREIRA -O PC do B vai participar da eleição que se aproxima, com a intenção e não poderia ser diferente, de conquistar um mandato eletivo que seja um instrumento a serviço da luta do povo e não de projetos pessoais. Um mandato eletivo pertence ao partido. Ninguém se elege, se não estiver filiado a um partido. O detentor do mandato tem obrigação de usá-lo para servir ao povo independente de quem votou nele ou não. Porém, o PC do B não estar nessa empreitada sozinho e hipoteca sua solidariedade aos companheiros do PT, PSOL e PT do B.

BEZERROS HOJE- Os partidos de esquerda estão alinhados numa proporcional estratégica para tentar eleger um representante. Você figura como um dos nomes embora nunca tenha sido candidato. Qual a importância dessa postulação?

RAIMUNDO FERREIRA- A nossa pré-candidatura surgiu devido a carência de outros nomes. A intenção do PC do B era ter vários pré-candidatos, especialmente mulheres. Infelizmente, não foi possível neste momento. É bom salientar que no Congresso Nacional, o PC do B é o único partido que tem mais deputadas do que deputados. A importância dessa pré-candidatura é demonstrar e despertar a consciência das pessoas que não é preciso ser rico, empresário, famoso, bonito e etc; para concorrer a um mandato eletivo. É preciso sim (e esse é o nosso propósito) despertar a classe trabalhadora em geral, mas principalmente, aqueles que são mais discriminados, ou seja, o agricultor, a empregada doméstica, o vaqueiro, o apicultor, o gari, o auxiliar de serviços gerais, enfim os trabalhadores do campo e da cidade. Só assim, organizados e atuando principalmente em um partido político, serão capazes de mudar para melhor o Município, o Estado, o País e por que não dizer, o mundo em que vivemos.

BEZERROS HOJE- Como você analisa o cenário político municipal e nacional?

RAIMUNDO FERREIRA- O cenário político nacional é desolador. Em grande parte pelos motivos que elencamos anteriormente. Em Bezerros, desde o ano de 2002 que não há oposição ao Poder Executivo na Câmara de Vereadores. Temos um Poder Legislativo que se cala diante do Executivo. Essa atitude fez com que o povo deixasse de ter sua voz exercida mediante seu representante mais próximo e consequentemente, sentiu-se desacreditado e enfraquecido. De lá pra cá a música toca da mesma forma. É só observarmos a nossa Câmara de Vereadores atualmente, que mostra dez vereadores na situação e um na oposição. Isso significa que onde existe unanimidade há suspeita de equívocos. O fato de não termos oposição não se reverteu em benefícios à população. Precisamos entender que uma oposição responsável faz-se necessária em nossa cidade.

BEZERROS HOJE- Os movimentos estudantis se arrefeceram em Bezerros ou houve uma nova mudança de postura com as redes sociais?

RAIMUNDO FERREIRA- Fazer movimento estudantil não é tarefa fácil. Antes, com todas as dificuldades, existia uma mobilização que abria portas para as pautas de todos os segmentos sociais. Nesse contexto, as bandeiras estudantis apareciam com bastante força, principalmente depois da retirada de Collor da Presidência da República que teve como protagonista maior os estudantes e a juventude do país. Hoje, com meios que facilitam mais abertura democrática para os estudantes, o que percebemos é um desinteresse da classe estudantil, uma vez que o movimento feito cara-a-cara trazia mais resultados. Aqui em Bezerros, a UESB já representou muito a agenda estudantil com conquistas importantes como a Lei Municipal que garante meia-entrada em eventos culturais. No entanto, desde o ano 2000, a UESB perdeu muita força inclusive com pessoas que tentaram fazer uso da entidade para promoção pessoal, ao invés de representar a quem devia.

BEZERROS HOJE- Suas considerações finais…

RAIMUNDO FERREIRA- Considerações Finais. Desde já, agradeço ao amigo Flávio Melo o espaço reservado a mim e afirmo ser importante a participação da população nesse meio de comunicação tão abrangente em nossa cidade. Esclareço que aceitei o desafio de ser pré-candidato pelo PC do B para essas eleições municipais com o intuito de fortalecer a luta pelos direitos da população. Espero que tenhamos muita coerência em escolher os próximos representantes para que possamos juntos acreditar em dias melhores.

“Que continuemos a nos omitir da política é tudo o que os malfeitores da vida pública mais querem.” Bertolt Brecht

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